Táticas Anti-navio do Buccaneer


Em 1952 foi reconhecido pelos almirantes britânicos a necessidade de uma aeronave anti-navio de longo alcance embarcada. A ameaça principal seriam os 24 cruzadores russos da Classe Sverdlov. Menos da metade entrou em serviço, mas mesmo assim era considerado uma grande ameaça as linhas de suprimentos britânicos. Geralmente a resposta seria produz um meio semelhante e melhor, mas com poucos recursos tentaram uma alternativa custo-efetivo com uma aeronave embarcada e não um navio com artilharia pesada. O requerimento era de uma aeronave de ataque transônica naval para voo sustentado a baixa altitude que iniciou com o projeto NA.39 e virou o Buccaneer.

Os radares de busca em terra eram ineficazes para detectar alvos voando baixo. Era esse ponto fraco que os Almirantes britânicos estavam explorando. Na época a maioria pensava em bombardeiros voando alto, mas começaram a pensar nas defesas de radares, caças e mísseis SAM. Os Almirantes britânicos viram que a penetração a baixa altitude teria melhores chances de sucesso, com um ataque surpresa abaixo da cobertura radar para aumentar as chances sobrevivência.

Era a época das quebras de recordes de velocidade, mas esta visão futurística levou ao caro TSR.2 e o cancelamento da compra do F-111. O conceito de ataque baixo não era novo. A RAF já tinha abandonado a idéia com os V-Bombers para longo alcance. Mas os Almirantes foram visionários pois voar bem baixo era mais fácil no mar do que em terra.

O requerimento era de uma aeronave capaz de voar a Mach 0.85, a 200 pés, com raio de ação de 400milhas a baixa altitude ou 800 milhas a grande altitude. Seria um bimotor biposto com peso máximo de decolagem de 40 mil libras e capacidade de levara 4 mil libras de armas. Os testes foram uma surpresa. O Buccaneer tinha boa razão de carga X alcance e era bem rápido baixo. A Turbina Spey permitia que voasse mais rápido e tivesse um melhor alcance e carga que o F-111 e Tornado a baixa altitude. A aerodinâmica também ajudava pois foi otimizado para voo subsônico e não para voo supersônico.

As armas eram o foguete guiado Green Cheese, com ogiva nuclear, que foi cancelado e substituído pelo projeto Red Beard, uma bomba tática nuclear da RAF planejada para o TRS2 que era disparada no modo toss. Com o uso de uma bomba nuclear não precisaria de boa precisão. Outras armas planejadas eram quatro bombas Red Angel, 24 foguetes, duas bombas penetradores de 900kg, quatro bombas de 454kg ou um pacote de quatro canhões Aden de 30mm.

Após o cancelamento do projeto TSR a RAF tentou comprar o F-111. Os F-4 Phantom assumiu o papel de ataque em terra que seria do TSR.2 e o Buccaneer atuaria no mar. O Reino Unido ficou a frente no ataque baixo. Em 1968 foi decidido passar os Buccaneer para a RAF e comprar mais aeronave no lugar do TSR.2 e F-111K. Realizaria missões de ataque e manteria a função anti-navio. De 1973 a 1983 era a melhor aeronave de ataque britânica até o Tornado IDS entrar em serviço. Mesmo saindo de operação ainda podia operar bem na missão de ataque marítimo. 


Táticas Anti-Navio do Buccaneer

As táticas anti-navio do Buccaneer se dividiam em táticas evasivas EVTAC (Evasion Tactics), táticas marítimas MARTAC (Maritime Tactics) e táticas vetoradas VASTAC (Vectored Assisted tactics).

O Buccaneer foi projetado para ataque nuclear a baixa altitude e logo pensaram em usar para ataque convencional. Então a tripulação tem que estar proficiente em vários perfis de ataque, com o perfil variando conforme o alvo e as defesas associadas, carga de armas e condições climáticas.

Com o uso de uma arma nuclear é usado o perfil LABS ou toss longo. O Buccaneer se aproxima do alvo voando alto até 200 milhas do alvo. O observador marca o alvo com o radar Blue Parrot antes de descer até o nível do mar e iniciar o "run in" a uma velocidade de 550kts e uma altitude de 100 pés. O Buccaneer voa um curso de colisão, com o navegador estimando o curso e velocidade do alvo e o vento corretamente. A 8km do alvo o piloto faz o "pull up" com 4-5g em um loop com o computador balístico disparando a arma a automaticamente. Depois faz o "rolling pull out" para fugir baixo em direção contrária. O perfil precisa de trancamento do radar no alvo e não é limitado pelo mal tempo. A precisão é de 100 a 150 pés com a precisão diminuindo contra alvos manobrando. O perfil LABS não é usado com armas convencionais.

Com armas convencionais o Buccaneer usa mais o perfil "medium toss". É similar ao LABS só que é feito mais próximo do alvo a no mínimo duas milhas. Usa bombas de 454kg com espoleta VT. São disparadas geralmente oito bombas sendo quatro levadas na baia de armas e quatro nos cabides das asas. São disparadas automaticamente na subida após o pull up.


Perfil de ataque toss do Buccaneer. A aeronave entra dentro do alcance das armas inimigas antes de disparar.

Outro perfil de ataque é o Locked-on Dive Toss (LODT). O Buccaneer se aproxima do alvo em mergulho antes de pull up ser iniciado entre 8 a 11 segundos do alvo. É um perfil de ataque cego com trancamento radar, mas é muito vulnerável as defesas.

Outro método é um mergulho a 20 graus com 7,5 graus de depressão da mira, com disparo manual ou automática. No Manual Depressed Sighline (MDSL) o piloto acompanha o alvo com a mira com o ponto pontaria com um "off set" para esquerda ou direita para compensar o vento. As bombas são disparadas a 2 mil pés. É um perfil bem preciso com muita proficiência pois exige muita carga de trabalho. Em operação real costuma ser atrapalhado por várias causas. É um método usado em caso de falha de equipamento.

O perfil primário da Royal Navy é o Automatic Depressed Sightlne "ADSL". Em um ataque visual é necessário um teto de nuvens de 4 mil pés para MDSL enquanto o ADSL precisa de 1500 pés. O disparo é iniciado pelo acelerômetro vertical. O piloto faz um mergulho com o alvo acompanhado na mira. Acima de 0,5g a bomba disparada. A mira tem uma depressão de 7,5 graus. O mergulho inicia a 2 mil pés a 450 kts. O CEP é de 100 metros ou menos mesmo com pilotos pouco experientes.

O método Relese on Radar Range (RRADSL) gera o mesmo erro do modo ADSL, mas pode ser difícil trancar o radar.

As bombas de 454kg retardadas por para quedas podiam ser usadas com o modo laydown a 200 pés e 500kts em um mergulho de 20 graus com o mergulho iniciando a 2 mil pés. O alvo era adquirido visualmente e era iniciado um voo preciso em altitude e velocidade. A aeronave ficava suscetível as defesas ao sobrevoar o alvo.

Os foguetes eram usados contra barcos pequenos como lanchas patrulhas. O Buccaneer podia disparar até quatro casulos com 36 foguetes de 68mm. Podia disparar em salvas tipo "slow ripple" e "fast ripple" em um mergulho razão de 10 graus com CEP de 20-30 pés. Os treinos eram contra alvos rebocados. A noite os disparos eram feitos a 15 graus subindo com o alvo marcado por um flare lepus que ilumina o alvo por dois minutos para dois ou mais Buccaneer atacarem.

O modo Vari-toss lembra o método LABS sendo suado para disparar o flare Lepus para iluminar alvos a noite. A precisão não é necessária, mas é o método mais vulnerável e a coordenação também é difícil.

Quanto mais preciso for um modo de ataque mais vulnerável a aeronave fica. A maioria dos modos era extremamente vulnerável aos mísseis SA-N-4. Com o modo medium toss apenas os mísseis SA-N-4 pode ser enfrentado com exposição curta e a capacidade de realizar evasivas. Se o alvo tem que ser atacado com urgência e a todo custo então usam os modos mais precisos sem considerar a vulnerabilidade. O problema era ter uma força de Buccaneer relativamente pequena.

Em um ataque com bombas tentam saturar as defesas com ataques coordenados por várias formações de Buccaneers. Podem ser usados até oito aeronaves com vários modos de ataque, com os primeiros usando o modo toss menos vulnerável para amaciar as defesas antes da segunda onda atacar com mais precisão e ficar mais vulnerável em um ataque visual. Um ataque coordenado é fácil de dar errado e precisa de muita prática.


Táticas coordenadas do Buccaneer.

A posição do alvo tem que ser determinada. Em exercícios a direção do ataque era dada para o Shackletons AEW. A aeronave determina a posições precisa do alvo continuamente. Em guerra era esperado que a força de aeronaves AEW não estaria disponível. Também não havia jamming dos rádios e radares em tempo de paz. O Canberra era uma opção para sondagem visual, mas com informações imprecisas. Então uma sondagem com os próprios Buccaneers seria realizado até o radar superar o jamming inimigo ou ser realizado o contato visual. Podem obter a direção do alvo facilmente, mas determinar o alcance seria difícil.

O run-in é feito a 200 pés ou menos para ficar abaixo da altitude efetiva dos mísseis SA-N-1 Goa e SA-N-3 Goblet. A velocidade não protege contra defesas de curto alcance como os mísseis SA-N-4 e a artilharia antiaérea. Voar baixo aumenta o consumo de combustível assim como a quantidade de fumaça preta. Os pilotos preferem voar a 420kts pois é a melhor velocidade de curva do Buccaneer.

Os pilotos tentam ligar o radar a 25nm do alvo ou menos. O ataque ocorre em vários eixos espaçada radialmente no run-in, mas o jamming de rádio pode atrapalhar a coordenação. As ECM do Buccaneer pode dar algum nível de proteção na fase final do ataque.

O mais importante é a capacidade dispare-e-esqueça. Atacam sempre baixo apenas fazendo pop-up a 5 mil pés para varredura rápida e aquisição do alvo. As táticas são concentradas no disparo de quatro bombas por aeronave. O radar atualiza os dados do alvo com modo SAR fazendo pop-up e congelando a imagem antes do ataque.

A coordenação de modos mistos de ataque era difícil de executar e podia ser afetado por imprecisão na navegação, localização do alvo e dificuldade identificação, sincronização, meteorologia e interferência eletrônica.

O radar altímetro (Radalt) era importante no mar. Os pilotos criaram táticas complexas coordenadas. Alguns atuavam baixo e outro a média altitude com o modo laydown. O objetivo era saturar e suprimir as defesas. O modo toss podia usar bombas com espoleta com altímetros para explodir a 100 pés e danificar as antenas dos navios inimigos. Outros voavam baixo para disparam os mísseis Martel e as versões anti-radar eram disparadas primeiro.

A sofisticação das defesas soviéticas aumentou no meio da década de 60. Um ataque com sucesso com bombas burras ficou difícil e passaram a pensar em adicionar a capacidade stand-off. Primeiro foi o míssil Bullpup da década de 50 que foi projetado com requerimentos da Guerra da Coréia. O Bullpup mostrou ser pouco confiável e sem precisão suficiente. Depois desenvolveram o míssil Martel.

Sem a possibilidade de ataque com o míssil Martel usariam o modo medium toss como modo primário. A razão de sucesso estimado para quatro Buccaneer com seis bombas de 454kg cada contra um navio era de 34-54 %. Com seis aeronaves a razão aumenta para 50-68%.

Os Buccaneer foram armados com bombas guiadas a laser Paveway e casulos Pave Spike para atacar navios. Contra navios as bombas eram disparadas no modo toss. O alvo também era iluminado a baixa altitude. O disparo a média altitude só era possível com superioridade aérea. O ataque seria seguido de um ou mais aeronaves a 5 km atrás em fila. No ataque a aeronave acelera até 550 knots a 200 pés voando paralelo em formação de batalha. A 25 milhas do alvo um sobe para localizar alvo antes de descer novamente. Próximo do alvo voam a 50 pés nas milhas finais.

Se uma aeronave de patrulha Nimrod está no local um VASTAC (Vector Assisted TACtic) é realizada. O Nimrod passa os dados do alvo para os Buccaneer para não precisarem fazer uma busca pop-up com o radar. A 15 milhas do alvo os Buccaneers chamam "bananas" anunciando as distâncias até o alvo. As duas aeronaves quebram a esquerda e a direita antes de subir a 4 g´s. Depois descem em uma curva lenta virando para a direção central. O casulo Pave Spike precisa que a aeronave se aproxime mais do alvo não sendo tão bom contra alvos bem defendidos. As bombas Paveway continuaram a ser usadas com arma secundárioa junto com os mísseis Martel e Sea Eagle.

Os Buccaneer não eram manobráveis como os outros caças, mas era muito difícil de perseguir voando a 100 pés e 580 kts. O alerta radar também deixava difícil perseguir. Uma arma defensiva era disparar uma bomba de 454kg retardada que irá explodir próximo do caça perseguindo.

Os Buccaneer não foram usados em conflito, mas tiveram oportunidade de atacar navios em tempo de paz. No dia 18 de março de 1967 o petroleiro Torrey Canyon de 118 mil toneladas encalhou. O petroleiro partiu em dois depois e o óleo começou a vazar. Queriam destruir o navio e queimar a carga e ordenaram que fosse atacado no dia 28 de março. Oito Buccaneer com bombas de 454kg atacaram antes do anoitecer. Dois decolaram as 14h e os outros as 15:30h. No total foram disparados 42 bombas com 30 acertos. O navio pegou fogo, mas o óleo continuava vazando. Chamaram a RAF para queimar óleo com firebombs em tanques extras. No dia seguinte o navio ainda estava inteiro com o mar tendo apagando o fogo. Logo perceberam que precisariam de muito mais ataques. Foram realizados um total de 26 saídas de caças Hunter atacando com napalm e foguetes seguido dos Buccaneers e depois dos Sea Vixens. No dia seguinte ainda estava intacto. Mais oito Buccaneers e nove Sea Vixen atacara e depois foi afundado com 30 saídas dos Hunter da RAF com napalm e foguetes. Após 3 dias um total 165 mil libras de bombas e 40 mil galões de querosene foram suados no ataque. Não sabiam que o óleo tinha se misturando com a água do mar e não queimaria.

Em 20 de abril de 1972 o navio tanque Silver Castle colidiu com o navio sul africano Pionerr a seis milhas ao sul do rio Bushman e pegou fogo. Conseguiram transferir a carga de óleo para outro navio e chamaram os Buccaneer sul africanos para afundar o navio longe da costa. No dia 13 de maio cinco Buccaneer chegaram depois de reabastecer em uma sexta aeronave e atacaram com bombas de 454kg. Um Shackleton viu a aeronave afundar no radar em 10 minutos.


Petroleiro Torrey Canyon após ser atacado. Várias lições foram tiradas da operação.

Entre 1984 e 1988 foi iniciado uma modernização de 36 Buccaneers. Estava planejado uma modernização dos Buccaneer com 60 aeronaves a 150 milhões libras. Mais 14 armazenados atuariam na missão de supressão de defesas. As aeronaves receberam um INS Ferranti FIN 1063, o ECM/ESM ARI 18228 passou para o padrão Guardian 200 e o lançador de engodos Tracor ALE-40. O datalink seria o Link 11/40 e não recebeu o casulo Sky Shadow de interferência eletrônica. Também foram armados com o míssil Sea Eagle.

Em janeiro de 1985 o orçamento diminuiu para 80 milhões libras diminuindo a quantidade de aeronaves a serem modernizadas de 150 para 60 aeronaves. As 14 aeronaves para supressão de defesa foram logo abandonadas. Em janeiro de 1986 caiu para 42 aeronaves. Receberam um rádio Plessey para padronizar com a RAF. O objetivo era manter a frota voando até 1995.

A diminuição no orçamento levou a retirada antecipada dos Buccaneers. Os Tornado tomaram a frente nas missões navais mesmo com alcance menor e levando apenas dois mísseis Sea Eagle. O último Buccaneer voou em março de 1994 na RAF.


Cobertura dos Buccaneer a partir de várias bases ao redor do Mar do Norte. Com um tanque de 425 galões na baia de armas e com a capacidade de ser reabastecido em voo o Buccaneer tinha longo alcance. 


Uma visão que os caças inimigos teriam ao interceptar uma formação de Buccaneer. Uma tática defensiva dos Buccaneer era colocar duas aeronaves bem mais atrás da formação principal (os spiker). Se fossem interceptados os caças inimigos ficariam vulneráveis aos outros dois Buccaneer.


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