Guerras Árabes-Israelenses
 
Na década de 60 os israelenses compraram o Mirage III francês para ser a base de sua força aérea. O Mirage era um interceptador puro, para atuar em qualquer tempo, contra bombardeiros voando alto armados com bombas nucleares. Podia cumprir a missão até no modo automático. Não era otimizado para manobra, autonomia ou carga de bombas. Não tinha vantagem nenhuma em relação a outros interceptadores da época.

Israel usou o Mirage como um caça bombardeiro nos cenários locais. Foram forçados a ter uma frota Hi-Lo-Mix e queriam uma aeronave de ataque que pudesse se defender.

O radar Cyrano foi uma decepção. Foi projetado para trancar em um alvo grande e olhando para cima. Depois dispararia o canhão automaticamente a 700 metros. Mas olhando para baixo, voando abaixo de 10 mil metros em terra ou 3.000 metros no mar, raramente conseguia trancar no alvo devido ao retorno do solo. Sempre superaquecia e tinha baixa disponibilidade. O radar era mantido apenas para realizar interceptação noturna sobre o mar. Com a entrada em operação do F-4 com um radar melhor o Cyrano foi substituído por lastro. Tiraram o lastro e a velocidade de pouso diminuiu de 150 para 120 nós e aumentou o limite de carga G.

Os pilotos de Mirage treinaram contra caças Mystere simulando MiG-17 e MiG-19. Tinham que desenvolver táticas contra aeronaves mais manobráveis. Fariam "hit and run" com velocidade superior ou desengajariam se tivessem que entrar em um combate em curva. Se tivessem que virar em combate era melhor subir para conservar energia ou mergulhar. Evitavam sempre perder energia em curvas fechadas. Esta tática era chamado stitching (costurar) pelos israelenses, ou combate vertical. Treinavam muito com canhão devido às falhas constantes dos mísseis.

Conseguir um "kill" com trancamento por radar era raro no Mirage. O sistema de tiro e pontaria real era muito impreciso com diferença seis milirads. O desvio do diâmetro do ponto de mira era de dois milirads. A solução foi instalar dois botões no manche para distância padronizada de 250m, e 400m e, apertando os dois juntos, 600m. A distância era estimada e a taxa de acerto aumento para 35%. Israel tinha bom controladores aéreos e boas táticas, mas o tiro com o Mirage era difícil. Inicialmente os pilotos de Mirage acertavam menos de 2%. Com treino aumentou para 22%.

Foi Israel que insistiu em colocar um canhão no Mirage III pois na época era considerado uma arma obsoleta. Em alguns combates um único acerto não derrubava o inimigo como seria esperado. Descobriram que a espoleta da munição de 30mm tinha atraso pois era um caça-bombardeiro. Zeraram a espoleta e passou a explodir no impacto. Os MiG-17, MiG-19 e Hunter podiam sofrer muito com o canhão, mas o MiG-21 era geralmente derrubado com um bom tiro. Um MiG-21 pousou com 16 tiros de 20mm no Vietnã mas ainda tinha fama de explodir fácil. Já o F-4 era realmente difícil de explodir. Pegava fogo mas voava.

As táticas de interceptação da década de 60 tinham três fases: controle de terra adequado para posicionamento com vantagem, táticas superior para conseguir boa posição de tiro e infringir dano letal. Os pilotos tinham de 1 a 3 minutos para engajar e derrubar ou eram ordenados a desengajar. Os controladores aéreos também eram muito bem treinados.

Os pilotos do Mirage eram muito bem treinados e especializados no combate ar-ar. Todos os pilotos eram treinados para atacar e não só dar cobertura como acontece com os alas novatos.

Na guerra de 1967 os mísseis ar-ar começaram a suplantar o canhão nas vitórias gradualmente. O Shafrir I foi disparado sete vezes entre 1964 a 1967 sem acerto. O Matra 530 fez dois disparos e conseguiu um acerto. Apenas um Shafrir foi lançado na Guerra de 1967 atingiu mas não acertou. Israel recebeu 60 mísseis AIM-9B Sidewinder junto com os F-4 Phantom II e foram usados pelos Mirages até o Shafrir 2 entrar em produção.

Os mísseis "maduros" só apareceram em 1969. Em um engajamento em julho de 1969, os Shafrir 2 conseguiram três vitórias em engajamentos com MiGs sírios, mais quatro kill com o canhão. Foi a  primeira vez que os mísseis quase igualaram com o canhão. Depois os esquadrões de Mirage equipados com o Shafrir 2 conseguiram 75% das vitórias com mísseis. Durante a guerra de atrito em 1969, 23% dos kills (11% para os mísseis) foram para o Shafrir 1 e 2 e AIM-9B. Um esquadrão de Mirage conseguiu 23 kills com 45 disparos com o Shafrir 2.

Na guerra de atrito os Mirage também usaram mísseis AA-2 capturados. Nove lançadores e varias dúzias de mísseis foram capturados na base de Bir Gafgafa em junho de 1967. O AA-2 era comparável ao AIM-9B e superiores ao Shafrir 1, mas eram inferiores Shafrir 2 e AIM-9D. Em 1970 Israel recebeu 250 mísseis AIM-9D junto com os F-4. Os mísseis preferiam disparar os AIM-9B pois ia direto ao alvo enquanto o Shafrir voavam em espiral e era feio de se ver. O Shafrir 2 voa em espiral por receber muita informação dos sensores.

Quando Israel recebeu seus Mirage 5, chamado Nesher, localmente, suas 3,5 toneladas de combustível interno era uma tonelada a mais que o Shahak (Mirage III) e era menos manobrável. Mas com 2 tanques extras nas asas o Nesher limpo era melhor. A maior capacidade de combustível dava melhor persistência no combate, com mais oportunidade de conseguir um kill, não tendo que desengajar por falta de combustível. Geralmente evitavam perseguir caça único pois podia estar entrando em uma fila de dois e ser pego por trás. Esta tática é chamada de "sandwich".

Os Mirages gastaram muitos tanques extras na guerra de 1973. Os tanques extras eram ejetados antes do engajamento, após ser vetorado, e raramente tinha combate. Depois não podia voltar para estação de patrulha e tinha que pousar. Um esquadrão de Mirage chegou a ejetar 50 tanques em um dia. Passaram a só ejetar os tanques das asas se conseguissem um contato visual. O tanque central costumava ser mantido pois não alterava muito o desempenho.

Os Mirage tinham uma média de um engajamento a cada 10 missões. Cerca de 1/3 dos pilotos se tornaram ases e 15% não conseguiu nenhuma vitória. O ás Giora Epistein derrubou 12 MiGs em cinco engajamentos. Em um engajamento ficou sozinho contra 10 MiGs quando os outros três Mirage da esquadrilha fugiram. Mesmo assim  acabou derrubando quatro MiGs sem ser derrubado.

Os Israelenses conseguiram testar um MiG-21 iraquiano que desertou. Era superior em desempenho ao Mirage, mas pior na visibilidade da cabine e tinha curto alcance. Os egípcios tinham muitas bases de reservas para caso de MiG-21 ficar sem combustível o que era relativamente comum. Os Israelenses achavam que tinham vantagem psicológica por saberem as suas fraquezas.

Os MiG-21 eram muito bons de para combate em curva, mas tinha controle duro e o piloto cansava muito. Os combates contra os MiGs eram raramente supersônicos após alguns segundos de manobras e as vezes chegam a velocidade de estol. Israel voava baixo para evitar a cobertura radar e por isso foram muitos combates a baixa altitude.

Os MiG-21PF recebidos pelos Árabes não tinham canhão e só eram armados com o AA-2 Atoll e por isso era considerado ruim para combate aéreo. O canhão GSh-23 tinha pouca munição e baixa razão de tiro. Só atiravam quando o alvo estava muito próximo. Os MiG-21 egípcios e sírios não receberam mísseis melhores como Israel com o AIM-9D e Shafrir 2.

Já o MiG-17 era extremamente manobrável, principalmente voando baixo e lento a cerca de 400km/h. Tinha um aviso para quando atingir 12 g´s e ainda não era o limite. Tinha o defeito de atirar para cima para atacar bombardeiros voando alto.

Os pilotos árabes eram geralmente mal treinados. Os Egípcios esperavam uma queda a cada 100 vôos em 1970. Melhorias no treinamento levou a 1/500 em 1972. A principal tática egípcia era separar a formação e lutar cada um por si. Havia exceções obviamente. Por exemplo, um piloto egípcio de MiG-21, que era especialista em acrobacia, conseguiu derrubar dois ases israelenses pilotando Mirages em uma batalha de 4 x 8 sendo que estavam em inferioridade.

A guerra de 1973 foi a última guerra em que jatos usaram táticas da Segunda Guerra Mundial. Os Mirage e Nesher derrubaram 397,5 MiGs entre 1966 e 1974. Em 1982 os Mirage ainda fizeram CAP junto com os F-15 nos combate do Vale de Bekaa. Eram vetorados juntos com os F-15 que aceleravam e desapareciam. Depois voltavam contando quantos kill conseguiram. Os pilotos logo viram que estavam pilotando aeronaves obsoletas.


O F-4E Phantom usado por Israel era menos manobrável e maior que o Mirage, mas a força bruta, o radar, e melhores aviônicos, além de um par de olhos a mais compensavam as deficiências. Inicialmente os F-4 era melhor nos treinos ar-ar contra os Mirages, mas os Mirages desenvolveram táticas para conservar energia. A vantagem do F-4 era a autonomia. O treinamento dissimilar terminava quando uma aeronave ficava com pouco combustível (bingo) por motivos de segurança e anulava a vantagem do F-4.

O F-4 era uma melhor
plataforma de mísseis com quatro mísseis de curto alcance e quatro de médio alcance contra dois mísseis do Mirage. O F-4 tinha mais 630 tiros de 20mm que davam seis segundos de disparos contra 10 segundos dos 250 tiros de 30mm do Mirage. Na pratica, o radar melhor, os mísseis e a autonomia fez o F-4 melhor nos combates reais ao contrario dos combates dissimilar contra os Mirage.

Apesar do F-4E se dar bem nos combates ar-ar, foi usado mais para ataque na guerra de 1973. O Mirage não tinha boa capacidade na arena ar-solo. Os F-4 realizaram as missões mais complexas como ataque a bases aéreas (Air Base Attack - ABA), interdição de campo de batalha e supressão de defesas. As vezes faziam ataques estratégicos e em outras ocasiões reforçavam as patrulhas de combate aéreo ou alerta em terra (QRA). Os A-4 Skyhawk e Mystere faziam apoio aéreo aproximado.

O F-4E foi a primeira aeronave multifuncional de Israel. Atuando como aeronave de ataque, tinham que alijar as cargas para entrar em combate aéreo. Mesmo derrubando um MiG o inimigo atingia o objetivo de defender o alvo quando o Phantom alijava as bombas. O F-4 tinha um botão para passar de configuração ar-solo para ar-ar e um botão de pânico para alijar as cargas pesadas como bombas.

Durante as missões de ataque o piloto era responsável por atacar enquanto o navegador cobria a traseira. Era relativamente comum o navegador chamar um "break" e salvar a aeronave. Se fosse uma aeronave monoposto seria provavelmente derrubada nestas situações. A tática de Israel é usar três ondas. A primeira para distrair interceptadores para longe, a segunda para varrer caças e a terceira ataca o alvo.

AIM-9D
Uma AIM-9D disparado de um F-4 israelense atinge um MiG-21 Egípcio em 14 de outubro de 1973 durante um ataque a base aérea Tantra. Conseguir um kill com um míssil passou a ser muito mais fácil com os mísseis.

Em 1973, até o nono dia da guerra, os F-4E conseguiram 51 vitórias mesmo não sendo direcionados para combate aéreo, mas perderam 23 aeronaves sendo três para os MiGs, ou 1/4 da frota. Depois as perdas diminuíram mais devido ao fim do estoque de mísseis SAM. Um detalhe é que os F-4 estavam carregando bombas quando interceptados enquanto os Mirages interceptavam MiGs com bombas. Antes da guerra o 'kill ratio" 25 X 1 e na guerra foi de 17 X 1 (ou 85x5). Os Mirage conseguiram 211 vitórias para 11 perdas, ou 19 x 1. Até 1982 os F-4E ainda conseguiram 6.5 kills. No total foram 116.5 kill entre 1969 a 1982. Foram 32 vitórias com o canhão, sete com o AIM-7 Sparrow, um com o Python 3 e o resto com o Shafrir e AIM-9. Outras 19 vitórias foram "manouvre kill". Os AIM-9D foram substituídos pelo Python 3 e os Sparrow passaram a equipar os F-15. A capacidade ar-ar do F-4E passou a ser irrelevante com a entrada em serviço do F-15 em 1976 e do F-16 em 1980. Os F-4E foram modernizados e continuaram atuando na arena ar-solo até serem substituídos pelos F-16I.

Em 1967 Israel conseguiu 58 vitórias com o canhão contra 8-12 vitórias dos árabes também com canhão e um com foguetes de 57mm. Na guerra de atrito de 1967 a 1970 foram cerca 100 vitórias de Israel,sendo 1/3 com os AIM-9B/D ou Shafrir, contra 10 vitórias dos árabes. Nesta fase os russos ajudaram os árabes a construir uma rede de radares, sistemas de inteligência eletrônica e interferidores para forcas. Os combate aéreos eram cheios de táticas de despistamento e emboscadas. Israel usava mais o Sparrow para assustar os egípcios, fazendo quebrar a formação e atacando com outras armas.

Em 1973 foram 400 aeronaves árabes derrubadas incluindo por mísseis SAM em duas semanas e meia. Os caças israelenses conseguiram 275 vitórias perdendo 12 aeronaves ou um kill ratio de 23x1. Cerca de 200 kill foram para os mísseis com guiamento IR mísseis com um Pk de 50% sucesso. Outras 50 kills foram com o canhão e cerca 12 para o Sparrow.

Os pilotos israelenses não comemoravam as vitórias durante a guerra com rasante na base. Os pilotos de caça eram considerados os "príncipes dos ares", mas eram os pilotos de aeronaves de ataque que realizavam as missões mais difíceis. Enquanto os pilotos de ataque entram em perigo em toda missão, os pilotos de caça engajam com bem menos frequencia em cada saída. Alguns até que eram derrubados perseguindo outros caças pela artilharia antiaérea, mas manter a frota era mais importante que um kill e por isso evitavam perseguir os alvos.


As lições do Vietnã das guerras árabes-israelenses influenciou os projetos dos caças do futuro, sistemas de armas e novos mísseis. Os projetos da década de 70 priorizava o combate aéreo e a agilidade, armas mais capazes e sistemas de guerra eletrônica robustos. Os radares eram capazes de detectar alvos voando baixo e teriam um canhão interno.

Guerra na África

A Guerra do Ogaden entre a Etiópia e Somália ocorreu entre 1977 e 1978. Foram vários combates aéreos entre aeronaves americanas contra soviéticas em um conflito de pequena escala.

A Etiópia estava equipada com caças F-5A e F-5E recebidos dos EUA e Irã. Estavam em menor número contra os MiG-17 e MiG-21 da Somália, mas o treinamento dado por mercenários israelenses e a disponibilidade do AIM-9B e P permitiu dominar os céus no local. Os Etíopes treinavam contra o F-86 simulando o MiG-17. Suspeitasse que algumas vitórias tenham sido por pilotos israelenses. Os Etíopes acabaram recebendo 40 MiG-21 russos, mas ainda preferiam o F-5E para combate aéreo. Conseguindo superioridade aérea conseguiram destruir as forças blindadas Somalis no solo sem dificuldade.

Entre 1975 a 1990, durante a guerra de fronteira, a África do Sul sempre conseguiu superioridade aérea contra Angola, apoiada por Cuba, mesmo estando em numero inferior, e qualidade inferior no fim conflito. No fim do conflito o MiG-23ML passou ter capacidade "all aspect" e longo alcance com a entrada em operação do AA-8 Aphid e AA-7 Apex.

Em um combate aéreo os MiG-23 conseguiram um acerto frontal contra um Mirage F-1CZ que foi perdido durante o pouso. Os sul-africanos não tinham contramedidas e os controladores em terra passaram a posicionar os caças de modo a evitarem um confronto frontal contra os MiG-23.

Com o embargo devido ao Apartheit os sul africanos tiveram que desenvolver seus próprios mísseis ar-ar. Junto com a experiência de combate da Força Aérea Sul-Africana contra caças soviéticos e a ameaça do R-73 que armava os MiG-29 os requisitos dos mísseis sul africanos sempre foram exigentes.Os combates na década de 80 mostraram que a capacidade todo aspecto, super manobrablidade, imunidade a contramedidas IR e longo alcance eram considerados essenciais. Logo a Força Aérea Sul-Africana lançou um programa para desenvolver um míssil de longo alcance e um de curto alcance de nova geração. O míssil de combate aéreo de curto alcance seria chamado de A-Darter (Agile Dart) e de longo alcance de R-Darter.

Durante o Conflito de Fronteira com Angola entre 1978 a 1988, os Mirage sul africanos voaram 683 saídas em 144 incursões. Mais de 100 mísseis SAM foram disparados e apenas um Mirage foi derrubado. As defesas aéreas eram consideradas de alta intensidade com cobertura radar inimiga em quase todo campo de batalha (dezenas de radares) e sem cobertura própria. Isto resultou no desenvolvimento de táticas modernas de vôo a baixa altitude e testaram novas camuflagens. Também resultou no desenvolvimento de ECM e RWR locais.

Cheetah
A Força Aérea Sul Africana não conseguiu comprar caças novos e teve que modernizar seus Mirage III para  o padrão Cheetah. A aeronave recebeu novo motor, aviônicos, radar, sistemas de guerra eletrônica, datalink e o míssil BVR R-Darter.

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