Guerra Eletrônica e Furtividade

A guerra do futuro poderá ser vista como uma combinação de furtividade e Contramedidas Eletrônicas (CME) para melhorar a capacidade de sobrevivência das aeronaves de combate. Uma aeronave convencional não pode ser operada de forma segura num ambiente de alta ameaça a não ser que o sistema de defesa aéreo integrado (IADS) inimigo seja pelo menos parcialmente colocado fora de operação.

Na teoria, uma forma extremamente furtiva (VLO) poderia sobreviver a quase todo tipo de ameaça. Contudo, o planejamento da maioria das operações aéreas caem no meio do espectro de ameaça. Com a expansão da capacidade da ameaça do radar, a furtividade e a CME tem um papel a ser realizado ao trabalharem juntos para aumentar a capacidade de sobrevivência, especialmente quando os ataques nos pontos chaves podem reduzir a capacidade do IADS inimigo.

Durante a década de 1980, havia uma competição entre a guerra eletrônica e as técnicas furtivas. Os defensores da guerra eletrônica se achavam ameaçados. Na década de 1990, foi percebido uma sinergia com a percepção que uma ajudaria a outra a se tornar mais efetiva. Antes se pensava que uma plataforma furtiva não precisaria de proteção eletrônica, mas nada pode ser invisível. A furtividade também nunca foi considerada absoluta, mas um degrau suplementado por uma lista sem fim de variáveis como o aspecto do radar, distância do radar e meteorologia.

A guerra eletrônica pode ser usada na fase de detecção e engajamento assim como a furtividade. A guerra eletrônica torna a furtividade mais efetiva de duas formas: da menos tempo para o sistema e o operador reconhecer e conter a interferência e o eco fraco do alvo é mais fácil de simular ou imitar com técnicas de despistamento.

A relação J/S, ou potência de interferência de saída pela potência do sinal refletido, é a grande beneficiária desse sinergismo. O objetivo é melhorar a razão J/S diminuindo a assinatura radar e melhorando a potência de saída.

Uma aeronave que reduza seu RCS por um fator de 10 diminui o alcance de detecção em 44%. A potência necessária nos interferidores também diminuiriam nesta proporção. Para uma mesma quantidade de potência, as contramedidas podem interferir com mais eficiência.

A energia emitida se espalha no espaço e dobrando a distância a energia decai 16 vezes. "Burnthrough" é a distância onde um radar pode detectar um alvo que está emitindo interferência (jamming) ou onde o eco é mais forte que a emissão do interferidor que também enfraquece com a distância. Um exemplo prático são duas pessoas conversando com uma música alta no fundo. Elas podem se aproximar ou ficar longe da música para conseguir ouvir o outro. Diminuir 100 vezes o RCS diminui o alcance de detecção em 1/3 e pode usar interferência para esconder 90% da distância.

As contramedidas são limitadas pela potência da aeronave, mas não para uma aeronave furtiva. O B-1B tem RCS 100 vezes menor que o B-52, ou 1% do eco, mas mesmo assim o sistema de interferência ALQ-161 pesa 2.250kg contra 2500kg do B-52. A potência não diminuiu, mas melhorou a efetividade em 100 vezes. A potência para "burnthrough" cai na mesma relação. O conceito de uso do B-1 considera que ainda tem que se aproximar do alvo, mesmo podendo lançar armas a longa distancia e ter que enfrentar várias ameaças ao mesmo tempo.

O B-2 tem capacidade de ECM com o sistema Northrop-Grumman AN/ZSR-63. Suspeita-se que tenha capacidade de cancelamento ativo. O sistema faz parte do sistema Lockheed Martin APR-50 Defensive Management System (DMS) capaz de detectar, localiza e identificar emissores ao redor da aeronave. O DMS inicial era o Northrop ZSR-62 que foi cancelado no meio da década de 1980.

Em alguns cenários, as CME também podem fornecer apoio para aeronaves furtivas contra certos tipos de ameaça. Enquanto os analistas tem decidido que o F-117 não se beneficiará do apoio das CME de uma aeronave especializada como o EA-6B na primeira noite de uma guerra, os dados sugerem que o uso adicional dos EA-6B seria bem vindo para as tripulações dos F-117 e B-2 nas missões subsequentes. Detecção tardia seria trocada por nenhuma detecção. Na Guerra de Kosovo, os B-2 voaram todas as missões com escolta de caça, de Guerra Eletrônica (GE) e Supressão de defesas aéreas inimigas (SEAD). Já é claro que para as aeronaves sem a assinatura do F-117, ou para aeronaves operando em outros ambientes, as CMEs podem contribuir significativamente para a capacidade de sobrevivência.

A Guerra Eletrônica surgeiu para defender as aeronaves do ataque do radar. Primeiro na fase de detecção e depois na fase de engajamento. Foi estimado que o uso de contramedidas eletrônicas e chaff na Segunda Guerra Mundial pode ter salvado 800 bombardeiros aliados e permitiu que atacassem mais baixo com maior precisão. Contra o Vietnã do Norte, aeronaves EB-66 foram usados para interferência de longa distancia (SOJ - Stand-off Jammer) pela USAF. A US Navy usou o EA-6B no final da guerra na mesma função. A USAF considerou o uso do EA-6B também para escolta, mas considerou o desempenho inadequado com o caça e instalou os sistema de detecção e interferidores do F-111 que se tornou EF-111 Raven.

Ainda no Vietnã, durante a operação Linebaker, a USAF usou o chaff, SOJ e casulos de auto-proteção para proteger os caças dos mísseis SAM. O Pk do SA-2 era de 1/15 em 1965, em 1968 caiu para 1/48 e em 1972 foi para 1/50. As lições foram usadas em 1973 por Israel, mas Israel não tinha recursos para manter o EB-66C e nem contava com contramedidas suficientes e preparadas para contrapor o SA-2 e ZSU-23. O resultado foi a perda de 102 caças, ou 37% da sua frota de aviação de combate.

Durante o conflito do Golfo em 1991, o EF-111 e EA-6B interferiam nos radares de alerta antecipado iraquianos. As baterias de mísseis SAM tinham que ligar seus próprios radares para busca que foram depois destruídos com mísseis anti-radar AGM-88 HARM. Os EF-111 não apoiaram diretamente os F-117 na Guerra do Golfo, mas ajudaram a despistar quanto ao alvo real da aeronave.

A USAF retirou o EF-111 de operação por ser mais caro de operar (US$ 5.500 por hora de vôo contra US$ 3.255 do EA-6) e tinha uma frota menor (40 contra 127). Estava previsto que iria operar até 2010. A USAF passou a usar o EA-6 em uma força conjunta com a US Navy.

O F-117 perdido durante o conflito de Kosovo em 1999 estava longe da cobertura do EA-6B de apoio, ou mais 180km, para evitar mísseis, e não conseguiu jammear efetivamente. Ainda em 1999, a USAF estudou o uso do B-52 para interferência a distância e o B-1 para interferidor de escolta. O EB-52 operaria a uma distância de 240km por 12 horas com interferidores ALQ-99 do EA-6B. O EB-1 operaria junto com o pacote de ataque e jamearia radares de busca e controle de interceptadores. O inimigo não poderia prever a direção e alvo do pacote e os radares das baterias de mísseis SAM teriam que fazer busca e ficariam vulneráveis ao ataque de mísseis HARM.

Como é mais difícil fazer uma aeronave ser furtiva na banda dos radares de busca de longo alcance, as aeronaves de interferência a distância ainda podem ser úteis para evitar que seja usado táticas de vôo a baixa altitude para fugir destes radares ou ou que os caças tenham que ser cobertos por camadas espessas e pesadas de RAM.

A URSS usava helicópteros equipados com interferidores para criar corredores seguros para a penetração de sua aviação tática. Estes corredores permitiriam que as aeronaves ficassem invisíveis a até 25km da ameaça (baterias de mísseis Hawk) ou diminuía em 50% a detecção a menos de 25km da ameaça.

Aeronaves convencionais retornam assinatura muito grande. As CMEs são limitadas pela potência dos interferidores aerotransportados. Uma aeronave de grande tamanho e potência seria a ideal para levar CMEs interna ou externamente devido a potência de saída que poderia ser fornecida e o pequeno impacto nas cargas externas ou espaço interno. Também não tem problemas de levar um segundo tripulante que geralmente aumenta em até 500kg o peso da aeronave e diminui o combustível interno. Esta aeronave também teria que ser grande.

Este problema é maior nas aeronaves de interceptação que precisam de um radar de longo alcance. Quanto maior a largura do "prato" do radar, maior o alcance. Um feixe fino emitido por uma antena estreita é melhor para busca, com menor alcance. Uma antena de maior diâmetro emite um feixe mais largo, com maior alcance, mais adequado em funções de busca e rastreamento de alvos. A compensação vem da necessidade de uma aeronave grande que também tem a autonomia necessária para CAPs de longa duração e vôos supersônicos por mais tempo além da presença de um segundo tripulante (WSO - Weapon Sistema Operator) para operar o radar e as CMEs. A capacidade de levar muitos armamentos externos aumenta o RCS e não é uma vantagem. Nos estudos de plataformas anti aeronaves furtivas o F-15 foi escolhido como boa plataforma por poder levar uma grande antena e ter potência de sobra.


Defesa Terminal

Mesmo que os defensores detectem uma aeronave furtiva, eles podem não ser capazes de engajá-lo facilmente. A furtividade "desarma" muitas ameaças, mas existem alguns sistemas modernos que ainda tem maior capacidade de engajamento e que são encontrados em número muito pequeno. O baixo RCS e assinatura IR do F-35 o manterá seguro de qualquer sistema de radar que seguirá o S-400 russo após 2025. Os sistemas de guerra eletrônica das aeronaves furtivas focam nestas poucas armas e agem nos modos terminais de trancamento e não nos modos de disparo dos mísseis como nos sistemas de guerra eletrônica convencionais.

O primeiro requerimento de defesa terminal é um sistema de detecção passivo de mísseis. O sistema deve ser confiável em determinar que o míssil está trancando na aeronave e não em outra aeronave pois as contramedidas expõem a aeronave a outras ameaças. No caso de um ataque, a melhor contramedida é a consciência da situação do piloto. Saber a direção da ameaça e manobrar o mais rápido possível para derrotar o míssil em vôo com velocidade, furtividade ou manobras evasivas. Uma aeronave furtiva pode mostrar seu pequeno RCS frontal para um míssil guiado por radar ou a parte fria para um míssil IR. Mísseis com guiamento ativa por radares Pulso-Doppler podem ter o trancamento anulado por manobras agressivas de 90 graus (manobra beam) no plano vertical durante alguns preciosos segundos.

A furtividade é boa para combate aéreo a longa distância (BVR) e contra mísseis de longo alcance, porém um dogfight ainda é inevitável e o engajamento de mísseis pode ocorrer. A vantagem está limitada a eficiência das contramedidas que devem enganar a ameaça.

A última defesa é lançar contramedidas Chaff ou IR ou contramedidas ativas descartáveis. O chaff e o flare são medidas defensivas que equipam o F-22. Eles aumentam a assinatura e denunciam a presença da aeronave, mas se está usando é porque foi detectado e já está sendo atacado. O lançamento de chaff e flare é feito separadamente pois tem comportamento aerodinâmico distinto.

Os radares Pulso-Doppler podem distinguir facilmente os alvos de despistadores flutuando. Um despistador rebocado resolve este problema e fornece uma única fonte usando flares e refletores de canto. Os despistadores rebocado são usado em navios desde década de 1940 para enganar torpedos e na década de 1980 passaram a ser usados em aeronaves para enganar mísseis.

O lançamento de drones despistadores deve saturar as defesas aéreas e minimizar as perdas de aeronaves ao forçar o gasto de munição pelo inimigo. Os despistadores não são usados pelas aeronaves furtivas para redução da assinatura, mas para controle de assinatura em propósitos de despistamento. Veículos despistadores devem imitar a assinatura da aeronave real, incluindo não só os níveis absolutos mas também as flutuações de assinatura.

As aeronaves de guerra eletrônica são dedicadas na missão de ouvir, detectar e neutralizar emissões inimigas. O método mais simples de interferência é transmitir na mesma freqüência do radar inimigo. Isto gasta muita energia e são sistemas pesados. A aeronave interferidora tinha que ser grande como o B-66 e também eram caros. No fim da década de 1960 apareceram as técnicas de despistamento que gastavam bem menos energia e eram sistemas mais leves. Podiam ser levados em casulos que tinham antenas passivas para detectar e mudar a informação recebida. O casulo retransmitia um sinal similar e era usado por dezenas de segundos e raramente por mais de um minuto. Quando o operador de radar percebe que está sendo enganada a aeronave já estava fora do alcance.

O F-35 usará um radar AESA que também terá capacidade de interferência. Poderá usar casulos para interferir do lado e atrás da aeronave pois o radar só interfere na frente. Poderá manter jamming durante toda a fase do combate. A US Navy já está estudando o uso do F/A-18F biposto para substituir o EA-6B e será chamado de EF-18F Growler. Já o F-35 terá capacidade de penetrar profunda ou se aproximar mais do alvo o que o ideal para interferência eletrônica.

Próxima parte: Superioridade Aérea

Atualizado em 01 de Novembro de 2005


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